É ainda hoje um tema muito discutido nos meios espíritas, se a proibição imposta pelo Estado Novo poderia ter sido evitada. De uma coisa estamos certos: os nossos companheiros que na altura ocupavam cargos no dirigismo espírita, fizeram o seu melhor.
Quem viveu o anterior regime sabe bem do clima de restrição de todas as liberdades, que imperava no nosso País. A assinatura da Concordata, entre Portugal e o Vaticano, não resultou num poder total da Igreja Católica sobre o País, como sucedeu com o ultramontanismo espanhol. No entanto, e bem à portuguesa, logravam-se resultados idênticos com os nossos "brandos costumes".
O Decreto nº 32 171, publicado no Diário do Governo a 29 de Julho de 1942 é bem o exemplo de um modo de fazer as coisas, mais diplomático e "limpo". Reza assim o Artigo 15ª:
«Todos os indivíduos que com o nome de magnetizadores, ocultistas, videntes, quiromantes, naturistas, fisioterapeutas ou semelhantes empreguem práticas, medicações ou quaisquer processos com os quais se procurem sugestionar doentes, e, de um modo geral, todos os charlatãis que usem de processos análogos com os quais procurem sugestionar doentes, serão condenados na pena a que se refere o artº 20º.»
Artº 20º, que determina:
«Pela forma indicada no artº anterior será encerrado o consultório médico, seja qual for a sua designação ou modalidade, que funcione sem que seja dirigido por médico ou médicos sem condições de exercer a profissão, de harmonia com o presente diploma.»
No mesmo saco da charlatanaria, que o Decreto não define, eram metidos naturistas e fisioterapeutas, especialidades da área da Saúde (sem que fossem enunciados que habilitação deveriam ter para se moverem dentro da legalidade) a par com quiromantes (praticantes do que se pode chamar uma arte divinatória, creia-se ou não nela), a par com ocultistas (um conceito elástico, mas que no seu significado original cabe no campo da filosofia), mais os magnetizadores, cuja especialidade acabaria por entrar na ciência oficial com o nome de hipnose...
Este tipo de generalizações busca confundir a opinião pública, manchar actividades que podem ser honestas ao colocar-lhes indistintamente o rótulo de charlatanaria, e dar às autoridades um poder arbitrário, ao ficar a cargo do polícia de plantão "aplicar" a lei segundo as suas mais ou menos acanhadas noções...
No Estado Novo eram mal vistos os praticantes de yoga, os naturistas, os espíritas, os protestantes, os que se interessavam por política e por filosofia, e, no geral, todos os que gostavam de saber mais e pensar pelas suas cabeças. A vigilância social, também chamada má-língua, era implacável para quem não se movesse nos estereótipos do homem marialva, dado ao futebol de bancada (eventualmente aos fados e às toiradas), e à mulher orgulhosamente ignorante, a quem ficava mal (caso não fosse da "alta sociedade"), ler mais que as fotonovelas "Simplesmente Maria"...
Charles Richet, Prémio Nobel da Fisiologia/Medicina em 1913, foi o criador da Metapsíquica. Em 1953, as actividades espíritas em Portugal foram proibidas, a pretexto da criação, pela Federação Espírita Portuguesa, do "Laboratório de Pesquisas Metapsíquicas Professor Charles Richet". Em 1969, conforme recorte de Imprensa que reproduzimos, discutia-se em Portugal se as mulheres tinham ou não o direito de usar calças. E se o Inverno Português é rigoroso...
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